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domingo, 7 de dezembro de 2014

Parece; mas não é.



De um jeito ou de outro, dezembro sempre traz para as pessoas uma sensação de balanço. Na prática, são as partidas dobradas de todos os anos com uma coisinha ali e outra acolá. A contabilidade, quase sempre, do nosso ponto de vista, é injusta. É que cada um sempre acredita merecer mais do que tem. Digo isso porque, nesses meus cinquenta e alguns anos, conheço pouca gente capaz de confessar-se muito satisfeita com seus ganhos e com o que acumulou.

No final do ano, essas reflexões vêm com mais força. Não por que tenhamos muito tempo para elas; ao contrário, é por causa da emergência de tantas contas a fechar. Muita gente olha para trás e se desespera com toda aquela lista de promessas não cumpridas que fez na virada do ano passado. É, pra muitos, desalentador.

Por falar em promessas não cumpridas, também os governos – é de praxe – costumam aproveitar a comoção natal-ano-novina, quando a racionalidade social hiberna um pouco, para fazer seus balanços. Sobretudo em ano eleitoral, o balanço aqui quer dizer uma sacudida para desgarrar uns e agregar outros sob o pomposo nome de reforma.

Parece que estamos vivendo uma dessas arrumações na administração do município. Não é a primeira vez que vemos uma dança das cadeiras e de DAS neste curto governo. Mas agora, com muito mais determinação, uma canetada exonerou na saúde, na agricultura, na administração, na cultura, no gabinete e não sei mais aonde vai parar.

Reformas administrativas são sempre bem-vindas. Elas em geral são concebidas para melhorar o desempenho do serviço, para renovar objetivos, para alcançar metas de desempenho. É normal que ocorram reformas, tanto nas empresas privadas quanto no serviço público. Nesse caso, o que não me parece normal é o diabo de uma coincidência: os exonerados não colocaram o santinho plástico do então candidato a deputado estadual da preferência do prefeito de Itaperuna. Ora, todo mundo na cidade sabe que os servidores públicos foram pressionados para aderir a certas candidaturas. “Convites” foram feitos a todas as secretarias; reuniões de alinhamento do voto promovidas, com insistência, ao arrepio da justiça eleitoral. Mas, se até os servidores que são públicos, e não serviçais deste ou daquele governo, sofrem esse tipo de pressão, imagine os ocupantes de cargos de livre nomeação.

Não há espaço aqui para comentar cada canetada do deputado eleito, digo, do prefeito. Por isso, urge tentar entender o rearranjo na Educação: cai a secretária e a pasta é dividida em três: administração, recursos humanos, e pedagógica. Caramba, tudo de bom, parece! Ainda mais pela competência reconhecida das professoras Joselene e Fabiana.

Ledo engano, do qual as subsecretárias – vamos chamar assim – nem sabem que estão participando. Sob a música de interesses privados e particulares fez-se a dança das cadeiras. Na verdade, a reforma é “denorex”. A canetada feita na pasta do segundo maior orçamento do município irá se completar, até a virada do ano, com a nomeação de uma supersecretária cujo nome, ganha um doce, quem disser que não sabe.

Nesse momento em que a sociedade discute reforma política, é bom informar ao distinto eleitor que o financiamento público das campanhas sempre existiu. É durante o mandato que se vai juntando a mala de dinheiro que compra os apoios eleitorais e os votos.
Publicado OFF - dezembro/2014

sábado, 8 de novembro de 2014

Quem não mu dan ça


Com certa liberdade de tradução, atribui-se a Heráclito o adágio de que a única certeza é de que tudo irá mudar. Lembra aquela história de que não podemos nos banhar duas vezes no mesmo rio porque as águas se renovam a cada instante?! Então! MUDANÇA virou um substantivo absolutamente na moda. Todas as outras certezas estão sendo relativizadas na medida em que não se pode submetê-las ao crivo da comprovação científica.

Nestes últimos dias de outubro, o papa Francisco pôs em xeque a milenar interpretação do Gênesis de que Deus criou o mundo em sete dias etc. O papa admitiu, com 150 anos num caso e cerca de 70 anos noutro de atraso, que a Teoria da Evolução das Espécies e o Big Bang são reais.

Também em outubro, o Sínodo dos Bispos sobre a Família trincou a unidade eclesial ao discutir e relatar, num primeiro documento, uma mudança grande da igreja no trato com os homossexuais e com as pessoas divorciadas. Infelizmente, a despeito da exortação papal de que Deus não teme coisas novas, a assembleia dos bispos refez o documento para que ele ficasse com a cara de uma aceitação envergonhada que teima em se impor contrária “às necessidades de nosso tempo e às condições de mudança da sociedade”. Ficou assim, como no catecismo, uma generalidade: não se condena a orientação homossexual e sim os atos como pecaminosos, indicando aos gays à castidade, "sem vida afetiva ou sexual". E continua: _É preciso integrar essas pessoas à sociedade. Andou para trás. São integradas desde sempre. "A decisão contrastou com a modernidade do beatificado Paulo VI, implementador das reformas que possibilitaram a missa em vernáculo, a participação decisiva dos leigos na vida da igreja e o diálogo com outras religiões. Apesar do pontificado de Paulo VI ter proibido o uso da camisinha e de outros contraceptivos, vou levar em consideração que o papa, sendo italiano, já estivesse se preocupando com a baixa taxa de fecundidade que está levando cidades italianas a oferecerem o bônus bebê para que as famílias tenham o segundo filho.

A palavra “mudança” permeou também o debate das eleições de outubro na esteira das manifestações de junho de 2013. Todo candidato e toda candidata queriam encarnar a mudança. Entretanto, do modo como foram apresentadas nos planos de governo, no horário eleitoral gratuito, nos debates televisivos, nas mídias sociais, nos panfletos as “mudanças” pareceram aos eleitores uma coisa muita difusa e pouco objetiva. Tanto é assim, que deve ter vencido o pleito a campanha que convenceu os eleitores de que melhoria é mudança, de que avanço é mudança, de que ampliação é mudança, de que tocar pra frente é mudança. Ou seja, que tudo que não está parado é mudança. É como as águas do rio. É como a dança.

Costumo dizer que mudança é uma atitude que enseja troca entre pessoas. Aliás, com o mesmo radical do vocábulo latino “mutatio” temos “mútuo”, que traz a ideia de que a mudança exige reciprocidade, troca. Por isso, às vezes me chateio com clamores de mudança vindos de certas pessoas. Na verdade, a mudança primeiro deve acontecer em nós mesmos. Caso contrário, corremos o risco de desejar a mudança nos outros e nas coisas sem primeiro fazê-la em nós.

Publicado na OFF - novembro/2014

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Dilma continua


Mais do que os nomes de Dilma e Aécio, o que esteve em jogo nessas eleições foi um projeto de Brasil. No embate, digladiaram-se a parte dos que queriam mudança sem risco e a dos que queriam mudança a todo custo. A palavra “mudança” permeou o debate das eleições na esteira das manifestações de junho de 2013. Entretanto, do modo como foram apresentadas nos planos de governo, no horário eleitoral gratuito, nos debates televisivos, nas mídias sociais, as “mudanças” pareceram aos eleitores uma coisa muita difusa e pouco objetiva. Tanto é assim, que venceu o pleito a campanha que convenceu os eleitores de que melhoria é mudança, de que avanço é mudança, de que ampliação é mudança, de que tocar pra frente é mudança. Ou seja, que se pode fazer mudança no continuísmo das grandes políticas públicas.

Particularmente, defendi e apoiei a candidatura vitoriosa de Dilma Roussef com mais entusiasmo do que o fiz em 2010. Em sua primeira eleição, votei em Dilma por causa do Lula, por causa do PT, por causa da esquerda. Agora, não! Votei em Dilma por ela mesma. Pela grande surpresa que foi como administradora do legado da transformação do país. Somente quem não quer ver há de negar o quanto o país mudou e está transformando para melhor a vida das pessoas mais simples.

A vida tem grid de largada. Cada indivíduo começa sua caminhada de um determinado ponto do progresso social. Mas no Brasil, era enorme a quantidade daqueles que ficavam na rabeira, sem nenhuma chance de participar desta corrida, desanimados com a própria sorte e crentes num determinismo perverso. Gerações de brasileiros estavam sujeitas ao conformismo e à reprodução da grande injustiça que é a falta de oportunidade.

Quando olho para este país de duas décadas para cá, o que vejo é uma impressionante transformação.  Há uma política de ações afirmativas que, em pouco tempo, fez superar a discriminação e a exclusão de milhões de brasileiros que de outro modo não teriam acesso à educação, à saúde, ao emprego, aos bens materiais, à proteção social ou ao reconhecimento cultural.
 

A presidenta Dilma venceu as eleições porque se apresentou como a mudança segura para a maioria dos eleitores. Não se elegeu como a menos pior. Ao contrário. Esta foi uma eleição onde se apresentaram grandes nomes da diversidade ideológica da política nacional. Também o Brasil não sai divido, como insistem alguns, destas eleições. Penso que a disputa entre os projetos de Brasil travada no primeiro e reafirmada no segundo turno aponta eixos bem marcados que, infelizmente não foram muito discutidos em razão do formato da campanha. De toda sorte, esses eixos estão amarrados por uma questão comum que considero a base de toda ação a partir de agora: a reforma política. A reforma das instituições políticas resume não apenas o anseio dos brasileiros todos, mas a condição para que possamos continuar avançando.